TJ-RJ decide que pedido de Cláudio Castro para anular delação em que ele é acusado de ter recebido propina vá para o STJ - Tribuna NF

TJ-RJ decide que pedido de Cláudio Castro para anular delação em que ele é acusado de ter recebido propina vá para o STJ

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) decidiu nesta segunda-feira (4), por 18 votos a 4, ser “incompetente” para julgar o pedido do governador Cláudio Castro (PL) para anular uma delação em que ele foi acusado de receber propina.

Ao determinar a incompetência do tribunal, o Órgão Especial do TJ – com atribuição para atuar em casos envolvendo autoridades do Rio de Janeiro – definiu que o caso deve ser enviado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília.

Castro foi um dos alvos da “Operação Catarata”, que investigou supostos desvios em contratos da Fundação Leão XIII, órgão subordinado à Vice-governadoria do Estado (entenda mais abaixo). E, de acordo com um funcionário de uma empresa que prestava serviços à fundação, Castro recebeu R$ 100 mil em espécie das mãos de um representante da companhia – o que o governador nega.

Sobre a decisão desta segunda, Carlo Luchione, advogado de defesa do governador, afirmou que a decisão do TJRJ “foi acertada”. Para ele, “o STJ é o órgão competente pra julgar qualquer feito envolvendo o governador”.

“Não tenho dúvidas de que o STJ vai aceitar o pedido e anulação da delação, em razão de um vício insanável de forma”, afirmou o advogado.

Luchione também disse que “o desembargador [que homologou a delação] não atentou que houve uma mudança legislativa que determinou alteração em determinados regramentos para a delação”. Essas mudanças, segundo o advogado, não foram observadas.

Tathiana Costa, advogada do delator Bruno Selem, ex-funcionário da Servlog, empresa que prestava serviços à Fundação Leão XIII, disse que a decisão do TJ ocorreu porque Castro trocou de cargo – antes era vice-governador e, depois, passou a governador com o impeachment de Wilson Witzel.

“Outra questão é o mérito do pedido da anulação da delação. Esse pedido não foi apreciado pelo Órgão Especial, mas alguns desembargadores adiantaram os votos e entenderam que não houve qualquer irregularidade na delação. A lei à época não exigia a gravação [audiovisual dos depoimentos do delator], mas mesmo assim houve uma gravação posterior”, afirmou a advogada.

Operação Catarata

Antes da votação desta segunda, no último dia 23 desembargadora Maria Augusta Vaz Monteiro de Figueiredo havia votado contra os pedido de Castro para anular a delação.

Os advogados de Castro entraram com um pedido para anular a delação que foi fechada entre o Ministério Público e Bruno Campos Selem. Segundo a defesa do governador, houve irregularidades no acordo de colaboração premiada. Eles alegaram que os depoimentos de Bruno Selem foram tomados sem qualquer tipo de gravação ou registro.

Bruno, que foi funcionário da Servlog, empresa que tinha contratos milionários com a Fundação Leão XIII quando Castro era vice-governador, contou ao MP que durante um encontro, em 2019, Castro recebeu R$ 100 mil em espécie, das mãos de Flavio Chadud, na sede da Servlog.

Embora a desembargadora Maria Augusta Vaz tenha votado contra o pedido da defesa, na época o julgamento não havia sido concluído porque o desembargador Nagib Slaibi Filho levantou a discussão sobre a competência do Órgão Especial do TJ no caso.

Dois desembargadores pediram vista do processo, e uma nova audiência – nesta segunda-feira (4) – foi marcada para decidir se o tribunal tinha ou não atribuição para julgar o pedido do governador.

Suposta propina

Em depoimento, Bruno Selem disse que “no dia 29/07/2019, véspera da prisão dele (do depoente) e de Flávio Chadud na Operação Catarata, Cláudio Castro foi até o escritório da Servlog, no Shopping Downtown, e recebeu das mãos de Chadud o pagamento de propina”.

Bruno calcula que Cláudio Castro tenha recebido cerca de R$ 100 mil em espécie, naquela ocasião, pois constatou que este era o valor aproximado que faltava no cofre da empresa após reunião de Flávio e Cláudio.

O delator contou aos investigadores que “não viu a entrega do dinheiro, mas tem certeza que tal fato ocorreu, pois na manhã daquele mesmo dia Flávio Chadud perguntou a ele qual era o valor total líquido das notas fiscais recebidas pela Servlog e pagas pela Fundação Leão XIII, com o claro objetivo de calcular o valor da propina”.

O depoimento revela que, até aquele momento, quase R$ 900 mil haviam sido pagos para a Servlog, e que, segundo o delator, esse valor serviu de base para Flávio Chadud calcular o valor da propina a ser paga para Cláudio Castro.

Em outro trecho do depoimento, Selem afirma que “também tem certeza da entrega da propina para Cláudio Castro no dia 29 de julho, pois o próprio Flávio Chadud disse ao depoente, quando estavam presos, na mesma cela em Benfica, que o pagamento havia sido feito na véspera, sendo que o depoente presenciou Flávio e Cláudio Castro sozinhos dentro da sala”.

Vídeos mostram encontro

Em 2020, a GloboNews teve acesso a vídeos de um encontro em que, segundo um delator, Claudio Castro, teria recebido R$ 100 mil em propina de um empresário investigado por corrupção.

Em 29 de julho de 2019, às 9h15, o então vice-governador Cláudio Castro chegou com uma mochila ao Shopping Downtown. Não era um evento público, e a visita não aparece na agenda oficial.

Às 9h26, Castro espera o elevador. Em seguida, entra em cena o empresário Flávio Chadud, dono da Servlog Rio. Os dois sobem juntos em direção à sede da empresa.

A operação foi no dia seguinte ao encontro entre o então vice-governador e Flávio Chadud, que foi preso.

No relatório da polícia, os investigadores afirmam que, “da análise cronológica das imagens, é possível estabelecer que Bruno Selem esteve no local em que afirmou ter sido realizado pagamento de propina por Flávio a Cláudio Castro”.

E continua dizendo ser “certo que Bruno pode ser visto chegando ao local, aproximadamente seis minutos após Flávio Chadud e Cláudio Castro chegarem ao local e, aproximadamente, uma hora antes de Flávio Chadud e Cláudio Castro deixarem o local, por volta de 10h33”.

A saída de Castro foi registrada pelas câmeras de segurança. O relatório destaca que Cláudio Castro desembarca do elevador, às 10h33, com uma mochila na mão esquerda.

Os investigadores dizem que, às 10h34, “é possível visualizar que Cláudio Castro cumprimenta discretamente Flávio Chadud com um toque nas mãos”.

Delação irregular

Os advogados do governador acreditam que a delação de Bruno Selem é irregular e “que nos dias 12, 14 e 18 de novembro de 2019 foram tomados os depoimentos do colaborador Bruno Selem, sem qualquer tipo de gravação audiovisual ou registro diverso”.

Ainda segundo eles, o MP só fez gravações no dia 22 de novembro de 2019 “de simplórias leituras do conteúdo daqueles depoimentos”.

A defesa de Cláudio Castro afirma que, ao não gravar os depoimentos, o Ministério Público levantou “suspeitas e dúvidas em relação à transparência, fidelidade e voluntariedade da delação”.

Os advogados dizem ainda que “o delator ainda opera de forma parcial porque visa os benefícios legais do acordo e, nessa condição, o colaborador realiza imputações específicas criminais ao delatado”.

A defesa do delegado aposentado Mario Chadud, pai de Flavio Chadud, também quer anular a delação. Mario foi preso na segunda fase da Operação Catarata, em 2020, acusado de atrapalhar as investigações.

MP diz que delação está dentro da lei

Já o Ministério Público argumenta que a gravação de uma delação só passou a ser obrigatória a partir de janeiro de 2020, ou seja, depois dos depoimentos de Bruno Selem.

O MP afirma que durante toda a negociação e constituição do acordo, o delator teve “acompanhamento e orientação das advogadas constituídas, profissionais de sua total confiança”.

O que dizem os envolvidos

Em nota, o governador Cláudio Castro afirmou que a delação não cumpriu os requisitos exigidos pela lei, e que o delator está sendo processado por calúnia e denunciação caluniosa.

Castro reiterou confiar na Justiça e aguarda que os fatos sejam esclarecidos o mais rápido possível.

A defesa do delator Bruno Selem disse que os requerimentos não são cabíveis e que vai tratar do assunto nos autos.

Já o empresário Flávio Chadud afirmou que não é possível se manter uma colaboração quando o principal acusador interpreta um personagem e revela total desconhecimento, ao ler um texto previamente preparado.

G1*

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