Royalties de aposentados: economistas alertam para riscos diante de eventual crise financeira do estado
Economistas chamam a atenção para os riscos para o pagamento de aposentados e pensionistas dos decretos 49.291 e 49.292 — ambos da semana passada, assinados pelo governador Cláudio Castro —, em caso de uma eventual crise financeira do estado. Os decretos modificam ato de 2009 e transferem as receitas com royalties de petróleo e participação especial do Fundo Único de Previdência Social do Estado do Rio (RioPrevidência) para o Tesouro Estadual.
Os dois atos do Executivo estabelecem que o estado complementará o valor, caso o fundo não tenha recursos para cobrir a folha de aposentadorias e pensões, reproduzindo o que já está na lei que criou o RioPrevidência em 1999. Mas, assinalam os economistas Bruno Sobral e André Marques, o Tesouro pode não ter dinheiro para arcar com suas despesas.
— É preciso ter recursos no Tesouro para cobrir um eventual problema na Previdência. O estado tem obrigação de cobrir, sim. Mas e se não tiver dinheiro? Não pode emitir títulos. A transferência dos recursos dos royalties para o caixa do Tesouro é uma medida arriscada e um erro, em cima de uma área muito sensível. Estão descapitalizando o RioPrevidência — enfatiza Bruno Sobral, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Uerj.
Para Sobral, os dois decretos do governador são indicadores que as medidas adotadas não foram suficientes para o Estado do Rio recuperar a sua saúde financeira. Entre elas, cita o Plano de Recuperação Fiscal, a majoração de alíquotas de ICMS, a flexibilização da aplicação de recursos de fundos e a liminar do Supremo Tribunal Federal limitando o pagamento anual da dívida pública do estado com a União ao valor desembolsado em 2023 (R$ 4,9 bilhões).
O economista André Marques, do Insper, lembra a crise financeira anunciada no fim de 2014, que viveu seu pior momento um ano depois, com o atraso de pagamento a funcionários, aposentados, pensionistas e fornecedores.
— Com os royalties, aposentados e pensionistas tinham um fluxo contínuo de entrada de recursos. Estavam protegidos e, com os decretos do governador, ficaram numa situação frágil financeiramente. Há um risco gigantesco. O estado viveu uma crise financeira grave recentemente. Se tiver problemas novamente, a quem vai pagar primeiro? O médico e o professor da ativa? Os fornecedores? Ou os aposentados? — questiona Marques.
Diante de pressões, foi publicado o decreto 49.292, estabelecendo limites para os recursos dos royalties serem transferidos para o Tesouro: até R$ 4,9 bilhões e até dezembro deste ano. O vice-presidente da Comissão de Tributação, Controle de Arrecadação e de Fiscalização da Assembleia Legislativa (Alerj), Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSD), no entanto, lembra que nada impede que o prazo seja prorrogado e o valor alterado por outro decreto.
Luiz Paulo e a deputada Martha Rocha (PDT) apresentaram, na última terça-feira, projeto de decreto legislativo para derrubar os decretos 49.291 e 49.292. A previsão de Luiz Paulo é que a proposta seja colocada em votação pela Assembleia Legislativa depois do primeiro turno das eleições municipais — marcado para 6 de outubro.
Este ano, o RioPrevidência já recebeu R$ 15,3 bilhões dessas fontes relativas ao petróleo e receberia mais cerca de R$ 5 bilhões até o fim de dezembro.
Equilíbrio financeiro
Na justificativa do projeto do Legislativo, os parlamentares alegam que o Decreto 49.291 pode “comprometer o equilíbrio financeiro, econômico e atuarial do Regime Próprio de Previdência Social” e que o Decreto 49.292, “ao autorizar o uso de recursos vinculados para outras finalidades que não sejam a cobertura das despesas previdenciárias, tende a comprometer a saúde financeira do Tesouro Estadual, gerando desequilíbrio fiscal”.
— Essa manobra contábil é deletéria e ilegal, podendo prejudicar ao Fundo Único do RioPrevidência, afetando diretamente o pagamento dos aposentados e pensionistas que dependem desses recursos — disse o deputado Luiz Paulo, acrescentando que a medida adotada, além de ilegal, tem por objetivo a aprovação das contas do governo, de 2024, pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Luiz Paulo diz que os dois decretos, entre outras ilegalidades, ferem o artigo 40 da Constituição Federal. O dispositivo estabelece que o regime da Previdência deve observar o equilíbrio financeiro.
A deputada Martha Rocha frisou a necessidade de os recursos destinados à Previdência serem utilizados de forma adequada:
— As medidas do governador podem comprometer a aposentadoria de milhares de servidores e pensionistas no curto prazo, colocando em risco o equilíbrio atuarial do fundo.
Procurado, o governo do estado informou, por meio de nota, que “reitera que o decreto busca aumentar a transparência e a segurança jurídica na gestão dos recursos de Royalties e Participação Especial do petróleo, dando maior segurança financeira ao Rioprevidência. E, com isso, garantir também maior segurança no pagamento de aposentados e pensionistas”.
O deputado estadual Flavio Serafini (PSOL) protocolou, na última sexta-feira, na Vara de Fazenda Pública, uma ação popular pedindo a suspensão do ato do governador. Serafini também protocolou no Ministério Público representação solicitando providências.
— A retirada dos royalties e participações especiais do RioPrevidência ameaça o direito à aposentadoria dos servidores do estado e agrava a crise fiscal — disse Serafini.
Fonte: O Globo