Fome atinge 2,7 milhões no RJ; mais da metade dos fluminenses tem algum tipo de restrição alimentar
O Estado do Rio de Janeiro tem mais de 2,7 milhões de pessoas passando fome. De acordo com dados divulgados nesta quinta-feira (23), mais de 57% da população do estado, de 17,4 milhões de pessoas, passa por algum nível de insegurança alimentar (entenda mais abaixo).
Os dados são regionais, referentes ao 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil.
A fome quadruplicou no Rio de Janeiro: em 2018, a porcentagem de fluminenses passando por insegurança alimentar grave era de 4,2% da população. Nesta última pesquisa, o número passou para 15,9%.
” Eu não consigo imaginar quase 60% do Estado do Rio de Janeiro em fome e a gente não estar em um estado de emergência, com a população junta, unida, para combater a fome”, afirmou Kiko Afonso, diretor executivo do Ação da Cidadania.
O levantamento é realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN).
No dia 8 de junho, o mesmo relatório demonstrou que o Brasil possui mais de 33 milhões de pessoas passando fome. São 14 milhões a mais em comparação com 2020.
Para Rodrigo Afonso, os dados revelam que o Rio de Janeiro é “um espelho do Brasil”.
“Mesmo sendo uma das regiões mais ricas do Brasil, você vê o espalhamento da fome para regiões urbanas mais ricas muito grande. No Rio de Janeiro, é um aumento de 400%. E você vê isso nas ruas, a quantidade de pessoas procurando emprego, pedindo comida e morando nas ruas”, ponderou.
Dona Janete: tristeza por não ter o que comer
Um dos lares com insegurança alimentar grave é o da desempregada Janete Evaristo, de 57 anos. Moradora do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, ela tem cinco netos para alimentar — uma filha morreu há dois anos, e o marido, há seis meses.
Sem ter o que comer, buscou ajuda em uma cozinha comunitária inaugurada esta semana no Andaraí e se emocionou ao conversar com a equipe de reportagem e contar as dificuldades diárias para alimentar a família. Após o relato, uma onda de solidariedade se formou para ajudá-la.
Metodologia
A metodologia da pesquisa considerou a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia), a mesma utilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para mapear a fome no país.
A Ebia classifica a segurança alimentar como sendo o acesso pleno e regular aos alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais. Já a insegurança alimentar é classificada em três níveis — leve, moderada e grave — da seguinte maneira:
Insegurança alimentar leve: há preocupação ou incerteza quanto ao acesso aos alimentos no futuro, além de queda na qualidade adequada dos alimentos resultante de estratégias que visam não comprometer a quantidade de alimentação consumida.
Insegurança alimentar moderada: há redução quantitativa no consumo de alimentos entre os adultos e/ou ruptura nos padrões de alimentação.
Insegurança alimentar grave: há redução quantitativa de alimentos também entre as crianças, ou seja, ruptura nos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos entre todos os moradores do domicílio. Nessa situação, a fome passa a ser uma experiência vivida no lar.
Perfil da Fome
Entre os que passam por insegurança alimentar grave e moderada, pretos e pardos estão mais presentes: de acordo com a pesquisa, 37,6% sofrem de algum nível de fome.
O percentual de mulheres que passam pelo mesmo problema é semelhante: 38,6%.
As estatísticas também indicam que 68,6% dos desempregados e 42,2% dos que estão no trabalho informal também são acometidos por insegurança alimentar moderada ou grave.
” A maior vítima é a mulher preta ou parda e com filho de até 10 anos em casa. A fome tem CEP, tem cor e tem gênero. O Rio de Janeiro é o reflexo disso”, afirmou Kiko.
Fonte: G1*