O Festival Doces Palavras, as viúvas do Livro Verde e o cinema do absurdo

Por Douglas Barreto da Mata
Tive notícias de que a audiência do referido festival gastro literário foi pífia…algo como o abraço no “corpo” da “terceira mais antiga livraria” que fechou… Sou campista do Parque Leopoldina, neto de ferroviários pelos dois lados, e confesso, tem coisa que só quem é daqui compreende. Nenhum outro lugar, senão Campos dos Goytacazes, tem um arremedo de “elite intelectual” com tamanha frustração existencial, talvez resultado direto de um processo histórico onde os ricos da terra massacraram com rara eficiência os pobres que os serviam. Este recalque talvez os livre do peso de consciência, caso possuam alguma.
Essa plêiade de janotas (desculpem os maneirismos paranasianos, mas são propositais) cultiva mitos de grandeza enquanto permanece de costas para seu povo. Assim, a livraria que dizem que era longeva, foi na maior parte de seu funcionamento uma tabacaria, e depois uma papelaria que vendia livros didáticos…uma fraude a estória.
Com a distribuição gratuita de material escolar na rede pública, e com a digitalização das metodologias pedagógicas nas escolas da classe alta, o negócio faliu, mas antes tentou se vender como “patrimônio cultural”, um local de leitura que nunca foi, em, uma cidade onde os filhos dos pretos e pobres chegaram à escola após a década de 80 e 90 do século XX.
Alheio a tudo isso, esse “pessoal que sabia o javanês” (ver o conto de Lima Barreto, O Homem Que Sabia Javanês) seguiu firme na tarefa de “culturalizar” (ou colonizar ?) uma cidade “por cima”, pregando para convertidos (pouquíssimos), no meio do deserto social onde se auto exilaram.
Lá, debaixo do sol escaldante da arrogância, gritam em uníssono, somos a primeira cidade a ter luz elétrica, somos a maior geografia do estado do Rio, aqui dormiu o Imperador, aqui tivemos o Cine Trianon, somos o espelho do Brasil…e claro, não poderia faltar a já citada livraria/tabacaria/papelaria. Com esse calor desesperador, surgem as alucinações e miragens, como um Festival de Cinema, que pode ser resumido a…a…a o quê mesmo?
Promessas de legado, de revolução e inovação das artes cinematográficas, surgimento de uma cadeia produtiva, impulso aos tratos acadêmicos da sétima arte, enfim, o paraíso na terra e…? Exibições de filmes em um mesmo lugar, sem nenhuma replicação pelos rincões da cidade, nenhum “cinema na praça”, seja em Custodópolis, seja no Parque Rosário ou Jockey Club. Matadouro ou Aldeia? Deuzolivre.
Lá na ponta, o Poder Público Municipal, espremido pelas pressões de sempre, vindas de uma mídia anacrônica, com forte sotaque cacofônico, que se acostumou a dar voz aos “Cabeças de Papelão” (ver o conto de João do Rio), acaba por patrocinar ou ajudar nesses eventos esvaziados, carentes de forma e conteúdo.
Ao menos, ninguém dirá que o Prefeito Wladimir Garotinho não foi generoso com esse pessoal. Fica a sugestão, apenas uma sugestão, não me levem a mal: a produção de cultura com um bem imaterial e público tem que ser elaborada com um viés claro de classe, em outras palavras, das periferias para o centro, nunca o contrário.
Esses movimentos têm que manter um “afastamento de respeito”, mas “uma proximidade de comprometimento e generosidade”. Falar com quem quiser e necessitar ouvir, e aprender com quem quiser ensinar. Dialogar, ao invés desses “monólogos em grupo”. Já chegou a hora desse pessoal ouvir amargas palavras: parem de encher a (nada santa) paciência e gastar dinheiro público por nada!


